Como eliminar um amante
De Xico Sá.
O leitor aflito me escreve. Quer ajuda, conselhos, alguma filosofia de consolação, ombro, ouvidos... Qualquer adjutório serve. Uma alma penada. Ainda mais no apagar das luzes do ano velho, quando a vida veste os seus bicos e babados mais bregas e sentimentalóides.
Havia aposentado a Miss Corações Solitários que acode as vítimas dos infortúnios e tsunamis do amor. Diante do apelo do amigo, não há como deixá-lo a mascar o jiló do abandono neste “já vai tarde” de 2005.
Está desconsolado, como o Sizenando de Rubem Braga, que viu a amada cair nos braços de um playboy. Um idiota que não sabia sequer uma palavra de esperanto.
A vida é triste, Sizenando, como soprou-lhe o cronista.
Com Amaro, chamemos assim o nosso ensaio de Bentinho, não foi diferente.
Quis o destino parafusar-lhe objetos pontiagudos à testa.
Sim, ela tem um amante. Daqueles amantes que se encontram à tarde, num intervalo qualquer, no recreio da vida chata.
Nem foi preciso contratar o detive particular, conta-me o nosso Amaro. Ele mesmo fez as vezes de cão farejador de sua própria desgraça.
Que fazer?, indaga, num email no qual até a arroba bóia em poças de lágrimas.
Mato o desgraçado?
Tiro a vida da desalmada?
Vou-me embora pra Tegucigalpa?
Salto mortal da ponte Buarque de Macedo?
Um trágico, esse rapaz. Como os de antigamente. Amaro é do tempo em que os homens coravam. Ainda tenho vergonha na cara, envaidece-se o próprio.
Sossega, Amaro.
O melhor que fazes, respondi ao marido em fúria, é sumir por uns dias, inventar uma viagem, e dar todo tempo do mundo ao infeliz desse amante.
Banalizar o amante, meu caro e bom Amaro.
Entendeste?
Deixar que eles durmam e acordem juntos. Que tenham seus problemas, que percam o luxo dos encontros fortuitos e vespertinos.
É necessário deixar a Bovary sentir o bafo matinal da rotina.
A vida dos amantes dura porque eles só vivem as surpresas e valorizam cada minuto do relógio que põem sobre a cabeceira daquele motel barato.
Nada mais cruel para o amante da tua mulher que presenteá-lo com o pão-com-manteiga do dia-a-dia. A rotina é o cavalo de tróia do amor.
Amaro, nada de violência ou besteiras desse naipe.
Ao amante, todas as chances do mundo. Ao amante aquela D.R., a famosa discussão de relação, em plena TPM.
Um amante nunca sabe o que venha ser uma mulher sob o domínio da TPM. Ela faz questão de reservar todos os direitos desse ciclo ao pobre marido.
Ao amante, Amaro, a tapioca fria e sem recheio da rotina do calendário.
Ao amante, Amaro, a falta de assunto.
Ao amante, os cabelos revoltos da mulher, naqueles dias em que nem mesmo ela se agüenta ou encara o espelho. Naqueles dias em que os cabelos brigam com as leis do cosmo e não há pente ou diabo que dê jeito.
Some, Amaro, depois me conta.
De Xico Sá.
O leitor aflito me escreve. Quer ajuda, conselhos, alguma filosofia de consolação, ombro, ouvidos... Qualquer adjutório serve. Uma alma penada. Ainda mais no apagar das luzes do ano velho, quando a vida veste os seus bicos e babados mais bregas e sentimentalóides.
Havia aposentado a Miss Corações Solitários que acode as vítimas dos infortúnios e tsunamis do amor. Diante do apelo do amigo, não há como deixá-lo a mascar o jiló do abandono neste “já vai tarde” de 2005.
Está desconsolado, como o Sizenando de Rubem Braga, que viu a amada cair nos braços de um playboy. Um idiota que não sabia sequer uma palavra de esperanto.
A vida é triste, Sizenando, como soprou-lhe o cronista.
Com Amaro, chamemos assim o nosso ensaio de Bentinho, não foi diferente.
Quis o destino parafusar-lhe objetos pontiagudos à testa.
Sim, ela tem um amante. Daqueles amantes que se encontram à tarde, num intervalo qualquer, no recreio da vida chata.
Nem foi preciso contratar o detive particular, conta-me o nosso Amaro. Ele mesmo fez as vezes de cão farejador de sua própria desgraça.
Que fazer?, indaga, num email no qual até a arroba bóia em poças de lágrimas.
Mato o desgraçado?
Tiro a vida da desalmada?
Vou-me embora pra Tegucigalpa?
Salto mortal da ponte Buarque de Macedo?
Um trágico, esse rapaz. Como os de antigamente. Amaro é do tempo em que os homens coravam. Ainda tenho vergonha na cara, envaidece-se o próprio.
Sossega, Amaro.
O melhor que fazes, respondi ao marido em fúria, é sumir por uns dias, inventar uma viagem, e dar todo tempo do mundo ao infeliz desse amante.
Banalizar o amante, meu caro e bom Amaro.
Entendeste?
Deixar que eles durmam e acordem juntos. Que tenham seus problemas, que percam o luxo dos encontros fortuitos e vespertinos.
É necessário deixar a Bovary sentir o bafo matinal da rotina.
A vida dos amantes dura porque eles só vivem as surpresas e valorizam cada minuto do relógio que põem sobre a cabeceira daquele motel barato.
Nada mais cruel para o amante da tua mulher que presenteá-lo com o pão-com-manteiga do dia-a-dia. A rotina é o cavalo de tróia do amor.
Amaro, nada de violência ou besteiras desse naipe.
Ao amante, todas as chances do mundo. Ao amante aquela D.R., a famosa discussão de relação, em plena TPM.
Um amante nunca sabe o que venha ser uma mulher sob o domínio da TPM. Ela faz questão de reservar todos os direitos desse ciclo ao pobre marido.
Ao amante, Amaro, a tapioca fria e sem recheio da rotina do calendário.
Ao amante, Amaro, a falta de assunto.
Ao amante, os cabelos revoltos da mulher, naqueles dias em que nem mesmo ela se agüenta ou encara o espelho. Naqueles dias em que os cabelos brigam com as leis do cosmo e não há pente ou diabo que dê jeito.
Some, Amaro, depois me conta.
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