Agradecimento (Wislawa Szymborska) Devo muito aos que não amo. O alívio de aceitar que sejam mais próximos de outrem. A alegria de não ser eu o lobo de suas ovelhas. A paz que tenho com eles e a liberdade com eles, isso o amor não pode dar nem consegue tirar. Não espero por eles andando da janela à porta. Paciente quase como um relógio de sol, entendo o que o amor não entende, perdoo, o que o amor nunca perdoria. Do encontro à carta não se passa uma eternidade, mas apenas alguns dias ou semanas. As viagens com eles são sempre um sucesso, os concertos assistidos, as catedrais visitadas, as paisagens claras. E quando nos separam sete colinas e rios são solinas e rios bem conhecidos dos mapas. É mérito deles eu viver em três dimensões, num espaço sem lírica e sem retórica, com um horizonte real porque móvel. Eles próprios não veem quanto carregam nas mãos vazias. "Não lhes devo nada" - diria o amor sobre essa questão aberta.
“A poesia é ao mesmo tempo um esconderijo e um alto-falante.” Nadine Gordimer