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Mostrando postagens de julho, 2005
Maria Elisa Ferraz Paciornik . Esse é o nome da autora do poema que eu postei há uns dias, no auge da crise de saudade e de desespero por perder meu amor para Goiânia. Vou repeti-lo aqui porque ele é lindo, mas depois de uma super temporada na minha nova segunda casa, meu coração já está melhor, obrigada. Olha, hoje não vem fazer confidência, vê se hoje não vem se queixar hoje estou morrendo de pena de mim, hoje não quero escutar.
O que é angústia Clarice Lispector, “A descoberta do mundo”. Um rapaz fez-me essa pergunta difícil de ser respondida. Pois depende do angustiado. Para alguns incautos, inclusive, é palavra de que se orgulham de pronunciar como se com ela subissem de categoria - o que também é uma forma de angústia. Angústia pode ser não ter esperança na esperança. Ou conformar-se sem se resignar. Ou não se confessar nem a si próprio, ou não ser o que realmente se é, e nunca se é. Angústia pode ser o desamparo de estar vivo. Pode ser também não ter coragem de ter angústia - e a fuga é outra angústia. Mas angústia faz parte: o que é vivo, por ser vivo, se contrai. Esse mesmo rapaz perguntou-me: você não acha que há um vazio sinistro em tudo? Há sim. Enquanto se espera que o coração entenda.
As sem razões do amor Carlos Drummond de Andrade Eu te amo porque te amo. Não precisas ser amante, e nem sempre sabes sê-lo. Eu te amo porque te amo. Amor é estado de graça e com amor não se paga. Amor é dado de graça, é semeado no vento, na cachoeira, no eclipse. Amor foge a dicionários e a regulamentos vários. Eu te amo porque não amo bastante ou demais a mim. Porque amor não se troca, não se conjuga, nem se ama. Porque amor é amor a nada, feliz e forte em si mesmo. Amor é primo da morte, e da morte vencedor, por mais que o matem (e matam) a cada instante de amor.
Olha, hoje não vem fazer confidência, vê se hoje não vem se queixar hoje estou morrendo de pena de mim, hoje não quero escutar. Maria Elisa (de sobrenome difícil, que eu esqueci)
O Fer foi pra bem longe e me levou com ele. Soneto do amor como um rio Vinícius de Moraes Este infinito amor de um ano faz Que é maior do que o tempo e do que tudo Este amor que é real, e que, contudo Eu já não cria que existisse mais. Este amor meu é como um rio; um rio Noturno, interminável e tardio A deslizar macio pelo ermo Em que seu curso sideral me leva Iluminado de paixão na treva Para o espaço sem fim de um mar sem termo. ***** Leminski você está tão longe que às vezes penso que nem existo nem fale em amor que amor é isto
Bilhete Mário Quintana Se tu me amas, ama-me baixinho Não o grites de cima dos telhados Deixa em paz os passarinhos Deixa em paz a mim! Se me queres, enfim, tem de ser bem devagarinho, Amada, que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...
Pneumotórax Manuel Bandeira Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e não foi. Tosse, tosse, tosse. Mandou chamar o médico: - Diga trinta e três. - Trinta e três... trinta e três... trinta e três... - Respire. ........................................................................... - O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o [pulmão direito infiltrado. - Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? - Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
Para o Fer levar com ele: Maiakovski Aparelhei o barco da ilusão E reforcei a fé de marinheiro. Era longe o meu sonho, e traiçoeiro O mar... (Só nos é concedida Esta vida Que temos; E é nela que é preciso Procurar O velho paraíso Que perdemos). Prestes, larguei a vela E disse adeus ao cais, à paz tolhida. Desmedida, A revolta imensidão Transforma dia a dia a embarcação Numa errante e alada sepultura... Mas corto as ondas sem desanimar. Em qualquer aventura O que importa é partir, não é chegar.
Lygia Fagundes Telles Estranho, sim. As pessoas ficam desconfiadas, ambíguas diante dos apaixonados. Aproximam-se deles, dizem coisas amáveis, mas guardam certa distância, não invadem o casulo imantado que envolve os amantes e que pode explodir como um terreno minado, muita cautela ao pisar nesse terreno. Com sua disciplina indisciplinada, os amantes são seres diferentes e o ser diferente é excluído porque vira desafio, ameaça. Se o amor na sua doação absoluta os faz mais frágeis, ao mesmo tempo os protege como uma armadura. Os apaixonados voltaram ao Jardim do Paraíso, provaram da Árvore do Conhecimento e agora sabem.
O que é triste pode ser bonito. E Lya Luft pode ser legal. O lado fatal Lya Luft I Quando meu amado morreu, não pude acreditar: andei pelo quarto sozinha repetindo baixo: "Não acredito, não acredito”. Beijei sua boca ainda morna, acarinhei seu cabelo crespo, tirei sua pesada aliança de prata com meu nome e botei no dedo. Ficou larga demais, mas mesmo assim eu uso. Muita gente veio e se foi. Olharam, me abraçaram, choraram, todos com ar de incrédula orfandade. Aquele de quem hoje falam e escrevem (ou aos poucos vão-se esquecendo) é muito menos do que este, deitado em meu coração, meu amante e meu menino ainda. II Deus (ou foi a Morte?) golpeou com sua pesada foice o coração do meu amado (não se vê a ferida, mas rasgou o meu também). Ele abriu os olhos, com ar deslumbrado, disse bem alto meu nome no quarto de hospital, e partiu. Quando se foram também os médicos e suas máquinas inúteis, ficamos sós: a Morte (ou foi Deus?), o meu amado e eu. Enterrei o rosto na curva do seu ombro com
Açúcar emprestado Luis Fernando Veríssimo Vizinhos de porta, ele o 41 e ela o 42. Primeiro lance: ela. Bateu na porta dele e pediu açúcar emprestado para fazer um pudim. Segundo lance: ela de novo. Bateu na porta dele e perguntou se ele não queria provar o pudim. Afinal, era co-autor. Terceiro lance: ele. Hesitou, depois perguntou se ela não queria entrar. Ela entrou, equilibrando o prato do pudim longe do peito para não derramar a calda. - Não repara a bagunça... - O meu é pior. - Você mora sozinha? Sabia que ela morava sozinha. Perguntara ao porteiro logo depois de se mudar. A do 42? Dona Celinha? Mora sozinha. Morava com a mãe mas a mãe morreu. Boa moça. Um pouco... E o porteiro fizera um gesto indefinido com a mão, sem dizer o que a moça era. Fosse o que fosse, era só um pouco. A conversa começou com apresentações e troca de informações - "Nélio", "Celinha", "Capricórnio", "Leão", "Daqui mesmo", "Eu também" - e continuou e
A seco Leila Míccolis Tem coisas que a gente só diz de porre se não o outro corre; mas passada a bebedeira, a gente acha que fez besteira, não devia ter falado, que se expôs adoidado, à toa e foi tolice. Finge-se então que se esquece o que disse, culpa-se a carência, a demência, a embriaguez responsáveis por tamanha estupidez. E é aceitando este estranho cabedal que quando se volta ao "estado normal", cada vez mais sós, na defensiva, corroídos morremos de cirrose... afetiva