Um Beijo
Vinícius de Moraes
Um minuto o nosso beijo / Um só minuto; no entanto
Nesse minuto de beijo / Quantos segundos de espanto!
Quantas mães e esposas loucas / Pelo drama de um momento
Quantos milhares de bocas / Uivando de sofrimento!
Quantas crianças nascendo / Para morrer em seguida
Quanta carne se rompendo / Quanta morte pela vida!
Quantos adeuses efêmeros / Tornados o último adeus
Quantas tíbias, quantos fêmures / Quanta loucura de Deus!
Que mundo de mal-amadas / Com as esperanças perdidas
Que cardume de afogadas / Que pomar de suicidas!
Que mar de entranhas correndo / De corpos desfalecidos
Que choque de trens horrendo / Quantos mortos e feridos!
Que dízima de doentes / Recebendo a extrema-unção
Quanto sangue derramado / Dentro do meu coração!
Quanto cadáver sozinho / Em mesa de necrotério
Quanta morte sem carinho / Quanto canhenho funéreo!
Que plantel de prisioneiros / Tendo as unhas arrancadas
Quantos beijos derradeiros / Quantos mortos nas estradas!
Que safra de uxoricidas / A bala, a punhal, a mão
Quantas mulheres batidas / Quantos dentes pelo chão!
Que monte de nascituros /Atirados nos baldios
Quantos fetos nos monturos / Quanta placenta nos rios!
Quantos mortos pela frente / Quantos mortos à traição
Quantos mortos de repente / Quantos mortos sem razão!
Quanto câncer sub-reptício / Cujo amanhã será tarde
Quanta tara, quanto vício / Quanto enfarte do miocárdio
Quanto medo, quanto pranto / Quanta paixão, quanto luto!...
Tudo isso pelo encanto / Desse beijo de um minuto:
Desse beijo de um minuto / Mas que cria, em seu transporte
De um minuto, a eternidade / E a vida, de tanta morte.
Vinícius de Moraes
Um minuto o nosso beijo / Um só minuto; no entanto
Nesse minuto de beijo / Quantos segundos de espanto!
Quantas mães e esposas loucas / Pelo drama de um momento
Quantos milhares de bocas / Uivando de sofrimento!
Quantas crianças nascendo / Para morrer em seguida
Quanta carne se rompendo / Quanta morte pela vida!
Quantos adeuses efêmeros / Tornados o último adeus
Quantas tíbias, quantos fêmures / Quanta loucura de Deus!
Que mundo de mal-amadas / Com as esperanças perdidas
Que cardume de afogadas / Que pomar de suicidas!
Que mar de entranhas correndo / De corpos desfalecidos
Que choque de trens horrendo / Quantos mortos e feridos!
Que dízima de doentes / Recebendo a extrema-unção
Quanto sangue derramado / Dentro do meu coração!
Quanto cadáver sozinho / Em mesa de necrotério
Quanta morte sem carinho / Quanto canhenho funéreo!
Que plantel de prisioneiros / Tendo as unhas arrancadas
Quantos beijos derradeiros / Quantos mortos nas estradas!
Que safra de uxoricidas / A bala, a punhal, a mão
Quantas mulheres batidas / Quantos dentes pelo chão!
Que monte de nascituros /Atirados nos baldios
Quantos fetos nos monturos / Quanta placenta nos rios!
Quantos mortos pela frente / Quantos mortos à traição
Quantos mortos de repente / Quantos mortos sem razão!
Quanto câncer sub-reptício / Cujo amanhã será tarde
Quanta tara, quanto vício / Quanto enfarte do miocárdio
Quanto medo, quanto pranto / Quanta paixão, quanto luto!...
Tudo isso pelo encanto / Desse beijo de um minuto:
Desse beijo de um minuto / Mas que cria, em seu transporte
De um minuto, a eternidade / E a vida, de tanta morte.
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