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Olhos não se compram. De Xico Sá. Do cinema lindo & phoda de existir e de como uma mulher pode encantar nos detalhes de nós dois. Quando ela pede pra gente virar os olhos ou fechá-los bem fechados. Só enquanto troca a calcinha, vupt, o barulhinho do elástico, mesmo com toda intimidade desse mundo, às vezes intimidade de anos, vale, vale. Só enquanto troca o sutiã, biquíni, parte de cima, ajeita a parte de baixo, areia do doce balanço da beira dos mares, só enquanto tira uma toalha do banho, primeira viagem, só enquanto está lindamente menstruada e quer guardar-se, embora saiba que atravessamos com amor e gosto todo o seu mar vermelho e ainda mais mares aparecessem a cada mês. “Feche os olhos”, diz. “Vira o rosto”, safadeza-se, diva sob seguras telhas. Só para manter o suspense do cinesmascope debaixo do mesmo teto. “Pronto, pode olhar”. Ai ela ressurge mais linda ainda, cabelinhos molhados, com aqueles cremes todos da Lancôme ou com simples sabonetes Dove ou aqueles de nove em cad...
Pobre amor http://redatorasdemerda.blogspot.com/ Vamos fazer assim, eu tiro você por algumas horas desse subúrbio onde você vive e levo-o para jantar em restaurantes onde nem o nome das entradas você vai saber pronunciar. Em troca você me apresenta sua família simples e ordinária que ainda ri vendo videocassetada afundada no sofá de couro falso. Eu ensino você a beber vinho de verdade, em taça de cristal, na temperatura certa. Enquanto você escuta Miles Davis e John Coltrane, fica sabendo o que penso do cinema alemão. Mas fique sabendo também não vejo a hora de você me levar para mais um inferninho e encontrar com seus amigos de brincos espalhados pelo corpo e amigas de cabelos multicoloridos. Me ensine o refrão desta banda que nunca ouvi dizer, me dê um beijo com gosto de cachaça, esfregue a barba por fazer no meu rosto. Me leve para acampar na beirada de uma cachoeira, mas por favor, não me faça ouvir reggae. Prometo não reclamar dos hippies tocando violão e fumando maconha envolta d...
Não acredito em destino. Acho que seria muito fácil se tudo já estivesse escrito e não dependesse de escolhas. E a vida não é mesmo fácil. Mas é engraçado como ela vai deixando umas pedrinhas pelo caminho, para que a gente não se perca tanto. Às vezes a gente insiste em não ver, mas elas estão lá. E é muito bom quando, de repente, fica possível enxergar. Dá um quentinho no peito quando se descobre que, aconteça o que acontecer, você tem para onde ir. Amor é isso, é quentinho no peito e pouso certo. E a gente perde tanto tempo atrás do frio na barriga que te deixa sem rumo e sozinha de uma hora pra outra...
Das utopias Mário Quintana Se as coisas são inatingíveis... ora! não é motivo para não querê-las... Que tristes os caminhos, se não fora a mágica presença das estrelas!
Meu último post me rendeu a declaração de amor mais linda do mundo. Te amo, Fer . . "Se se ama alguém com muita força, amam-se também todas as coisas que pertencem a essa pessoa, as roupas que ela porta e, ainda mais, seu rosto, suas mãos e todas as partes de seu corpo. Sempre desejamos ter tudo dela; uma parte para fazê-la também parte de nós mesmos, ou seja, eu poderia devorar por amor. (citado por Havellock Ellis) O tic-tac; Os primeiros cabelos, pequetitos, quando a testa acaba; A sandália que anda sozinha; Os pés esticados, quando espreguiça; O Esquilo; A mão com pinta!; A mão sem pinta! (Tem de todos os estilos); As costas; Ah, as costas!; O colo; O palm-top; O NARIZ!!!; A biblioteca, "gigantesca", vários armários ocupados; Os pitorescos estilos de dança; A gargalhada; A gargalhada delícia e que contagia; A gargalhada que me mata de saudades; O humor; A inteligência; Quando a calma aparece; Quando a ira cede e a razão desponta; Quando abre os olhos de manhã e dá um...
Se se ama alguém com muita força, amam-se também todas as coisas que pertencem a essa pessoa, as roupas que ela porta e, ainda mais, seu rosto, suas mãos e todas as partes de seu corpo. Sempre desejamos ter tudo dela; uma parte para fazê-la também parte de nós mesmos, ou seja, eu poderia devorar por amor. (citado por Havellock Ellis)
Belo Belo Manuel Bandeira Belo belo minha bela Tenho tudo que não quero Não tenho nada que quero Não quero óculos nem tosse Nem obrigação de voto Quero Quero Quero a solidão dos píncaros A água da fonte escondida A rosa que floresceu Sobre a escarpa inacessível A luz da primeira estrela Piscando no lusco-fusco Quero quero Quero dar a volta ao mundo Só num navio de vela Quero rever Pernambuco Quero ver Bagdad e Cusco Quero quero Quero o moreno de Estela Quero a brancura de Elisa Quero a saliva de Bela Quero as sardas de Adalgisa Quero quero tanta coisa Belo belo Mas basta de lero-lero Vida noves fora zero
A Marina me deu de presente, e agora eu dou de presente pra ela (a vida tem uns encontros - mesmo os virtuais - inusitados e tão generosos...). Testamento do Brasil Paulo Mendes Campos Que já se faça a partilha. Só de quem nada possui p nada de nada terei. Que seja aberto na praia, não na sala do notário, o testamento de todos. Quero de Belo Horizonte esse píncaro mais áspero, onde fiquei sem consolo, mas onde floriu por milagre no recôncavo da brenha a campânula azulada. De São João del-Rei só quero as palmeiras esculpidas na matriz de São Francisco. Da Zona da Mata quero o Ford envolto em poeira por esse Brasil precário dos anos vinte (ou twenties), quando o trompete de jazz ruborizava a aurora cor de cinza de Chicago. Do Alto do Rio Negro quero só a solidão compacta como o cristal, quero o índio rodeando o motor do Catalina, quero a pedra onde não pude dormir à beira do rio, pensando em nós-brasileiros - entrelaçados destinos - como contas carcomidas de um rosário de martírios. De ...
A namorada Manoel de Barros Havia um muro alto entre nossas casas. Difícil de mandar recado para ela. Não havia e-mail. O pai era uma onça. A gente amarrava o bilhete numa pedra presa por um cordão E pinchava a pedra no quintal da casa dela. Se a namorada respondesse pela mesma pedra Era uma glória! Mas por vezes o bilhete enganchava nos galhos da goiabeira E então era agonia. No tempo do onça era assim.
Entre amigos Martha Medeiros Para que serve um amigo? Para rachar a gasolina, emprestar a prancha, recomendar um disco, dar carona pra festa, passar cola, caminhar no shopping, segurar a barra. Todas as alternativas estão corretas, porém isso não basta para guardar um amigo do lado esquerdo do peito. Milan Kundera, escritor tcheco, escreveu em seu último livro, "A Identidade", que a amizade é indispensável para o bom funcionamento da memória e para a integridade do próprio eu. Chama os amigos de testemunhas do passado e diz que eles são nosso espelho, que através deles podemos nos olhar. Vai além: diz que toda amizade é uma aliança contra a adversidade, aliança sem a qual o ser humano ficaria desarmado contra seus inimigos. Verdade verdadeira. Amigos recentes custam a perceber essa aliança, não valorizam ainda o que está sendo construído. São amizades não testadas pelo tempo, não se sabe se enfrentarão com solidez as tempestades ou se serão varridos numa chuva de verão. Verem...
A igreja diz: O corpo é uma culpa. A ciência diz: O corpo é uma máquina. A publicidade diz: O corpo é um negócio. O corpo diz: Eu sou uma festa. Galeano, “As palavras e as coisas”, 1994.
Maiakovski Nos demais, todo mundo sabe, o coração tem moradia certa, fica bem aqui no meio do peito, mas comigo a anatomia ficou louca, sou todo coração.
Os visitantes Lygia Fagundes Telles Quando acordei, vi um diabinho montando no meu peito e outro no teto, dependurado no lustre. Coçava o ouvido com o rabo. Olhei para um, olhei para outro e não senti nem medo nem curiosidade, não senti nada, absolutamente nada. Ausência de emoção de qualquer espécie, o oco. Inerte, branca, fiquei olhando e meu olhar era exaurido como um sol apagado, só memória do outro sol mas sem nostalgia. Sem sofrimento. O diabinho mais próximo viu minha indiferença e ficou de pé no meu peito, se desmanchando em caretas para me impressionar. Não me impressionei: tinha chegado o fim do amor e desse incêndio não restara pedra sobre pedra, osso sobre osso, Roma de trás para diante com letra por letra queimada e reduzida a carvão. Ora, que me importa, eu disse. Vocês aí, que me importa. Rolei a cabeça no travesseiro e minha cabeça era opaca sem o gorro de pedras fulgurantes que durou enquanto durou a aventura. Fiquei olhando a parede vazia, os olhos também vazios. Qu...
Um anjo vem todas as noites: senta-se ao pé de mim, e passa sobre meu coração a asa mansa, como se fosse meu melhor amigo. Esse fantasma que chega e me abraça (asas cobrindo a ferida do flanco) é todo o amor que resta entre ti e mim, e está comigo. Lya Luft
A Frase L. F. Veríssimo O melhor texto de publicidade que eu já vi era assim: uma foto colorida de uma garrafa de uísque Chivas Regal e, embaixo, uma única frase: "O Chivas Regal dos uísques”. O anúncio é americano. Em algum anuário de propaganda, desses que a gente folheia nas agências em busca de idéias originais na esperança de que o cliente não tenha o mesmo anuário, deve aparecer o nome do autor do texto. No dia em que eu descobrir quem é, mando um telegrama com uma única palavra. Um palavrão. Que tanto pode expressar surpresa quanto admiração, inveja, submissão ou raiva. No meu caso, significará tudo ao mesmo tempo. "Palavrão PT Segue carta explosiva PT Abraços." Duvido que o autor da frase receba o telegrama. O cara que escreveu um anúncio assim não recebe mais telegramas. Não atende nem mais a porta. Não se mexe da cadeira. Não lê mais nada, não vê televisão e fala somente o indispensável. Passa o dia sentado, de pernas cruzadas, com o olhar perdido. Alimenta-se ...
Camadas Leila Míccolis Ser livre não é manter-se intocável, sem entregas, nem se dar também, às cegas, a tudo o que nos agrade. Ser livre é viver a idade que sente o nosso querer, é viver conforme a vida é sobretudo viver. E viver é mergulhar pra emergir com o submerso, ampliando,a cada dia, os limites do universo.
Escolher J. Cabral de Melo Neto é sempre tarefa difícil. Amo, amo, amo. Olha aí um dos meus preferidos: A educação pela pedra João Cabral de Melo Neto Uma educação pela pedra: por lições; para aprender da pedra, frequentá-la; captar sua voz inenfática, impessoal (pela de dicção ela começa as aulas). A lição de moral, sua resistência fria ao que flui e a fluir, a ser maleada; a de poética, sua carnadura concreta; a de economia, seu adensar-se compacta; lições da pedra (de fora para dentro, cartilha muda), para quem soletrá-la. Outra educação pela pedra: no Sertão (de dentro para fora, e pré-didática). No Sertão a pedra não sabe lecionar, e se lecionasse, não ensinaria nada; lá não se aprende a pedra; lá a pedra, uma pedra de nascença, entranha a alma.
De tanto te pensar, me veio a ilusão. A mesma ilusão Da égua que sorve a água pensando sorver a lua. De te pensar me deito nas aguadas E acredito luzir e estar atada Ao fulgor do costado de um negro cavalo de cem luas. De te sonhar, tenho nada, Mas acredito em mim o ouro e o mundo. De te amar, possuída de ossos e abismos Acredito ter carne e vadiar Ao redor dos teus cismos. De nunca te tocar Tocando os outros Acredito ter mãos, acredito ter boca Quando só tenho patas e focinho. De muito desejar altura e eternidade Me vem a fantasia de que Existo e Sou. Quando sou nada: égua fantasmagórica Sorvendo a lua n'água. Hilda Hilst
Indiferença Guilherme de Almeida Hoje, voltas-me o rosto, se ao teu lado passo. E eu, baixo os meus olhos se te avisto. E assim fazemos, como se com isto, pudéssemos varrer nosso passado. Passo esquecido de te olhar, coitado! Vais, coitada, esquecida de que existo. Como se nunca me tivesses visto, como se eu sempre não te houvesse amado Mas, se às vezes, sem querer nos entrevemos, se quando passo, teu olhar me alcança se meus olhos te alcançam quando vais. Ah! Só Deus sabe! Só nós dois sabemos. Volta-nos sempre a pálida lembrança. Daqueles tempos que não voltam mais!